quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O Judeu

“Ich Tino num tá cheirando bein aqui não”... foi com estas singelas palavras que Carciano me informou que havia gaseado novamente a atmosfera com sulfato de feijão com arroz de 3 dias, re-aquecido na fogueira que flamejava lá embaixo no bidão junto à betoneira. Dito isto no topo de um andaime que dá para o 23º andar de um prédio em construção, onde não há escapatória possível, só me resta esperar que o anticiclone estacionado a meio do Atlântico se dirija para junto de nós e leve o metano expelido pelos intestinos brasileiros sentados a meu lado para bem longe, antes que danifique o reboco acabado de chapar no tijolo virgem.
Embrenhado neste caos olfactivo de índole flatuleica, esqueci-me de ir recolher o saco com a roupa interior da minha sogra que a minha excelsa esposa havia deixado na lavandaria do sr. Itzhak Stern, há cerca de 3 semanas para limpar os ácaros incrustados por utilização abusiva do mesmo vestuário.
Quando me decidi a descer até solo firme e ir ao encontro do “judeu” como pomposamente era chamado o sr. Stern por todos os seus vizinhos de extrema direita, já passava das 17h00, pelo que foi sem colocar o capacete, cotoveleiras e joelheiras que me sentei no meu monociclo e pedalei desenfreadamente estrada molhada abaixo. Não fora uma pequena barricada de pneus a arder, colocada no meio da estrada pelo grupo pacifista “Recém Mamãs Zen” e não teria sido obrigado a pedir o estojo de primeiros socorros assim que cheguei à lavandaria, para desinfectar as feridas que pululavam as minhas articulações superiores e inferiores. Na cabeça estava ileso, pois pelos vistos dar à luz afecta a capacidade motora de acertar com pedras em alvos em movimento.
Quando pedi a minha encomenda fui surpreendido com a informação de que a roupa não havia sido lavada e que naquela lavandaria nunca o seria, pois tratavam-se de vestimentas indignas para uma senhora. Nesta altura convém referir que a imponente figura que se prostrava à minha frente era um indivíduo nascido há 82 anos como Wolfgang Schneitz numa Clinica de Abortos de Nuremberga, tendo logo ali originado uma queixa no Livro de Reclamações por parte da mãe-que-não-queria-ser e havia pertencido às SS Nazis, tendo sido destacado para o Campo de Concentração de Birkenau. Com o final da Guerra converteu-se ao islamismo e refugiou-se na Palestina, de onde lançava amiúde ataques terroristas contra oficinas de carpintaria luzemburguesas em Haifa. No último desses ataques vestiu-se de coelhinho da Páscoa e dirigiu-se a uma loja de frutas tropicais, na esperança que alguém lhe apertasse o pompom que camuflava o rabo do coelho e despoletasse o engenho explosivo que trazia à cintura. O aperto chegou pela mão de um jovem moreno de 54 anos, mas a única explosão que se deu foi a do amor. Rapidamente se converteu ao judaismo e ao homossexualismo, emigrando então para Lisboa e estabelecendo-se no Martim Moniz, como profissional da lavagem de vestuário a seco ou molhado, não perdendo no entanto o seu espirito conservador, o mesmo que o impedia de aceitar trabalhos que chocassem com a sua vertente mais púdica.
Da minha parte fui obrigado a aceitar a renitência do “judeu” para com as roupas que estavam dentro do saco, especialmente no wonderbra e na cueca fio dental de tamanho avassalador, suficiente para a Inquisição enforcar 3 hereges e ainda atar ao poste da fogueira mais 2 bruxas. As meias de ligas estavam laças o que denotava uma utilização assustadoramente habitual, para uma senhora de 98 anos internada num Lar. Num ápice coloquei tudo dentro do saco e disse para o meu interlocutor incinerar aquilo tudo. O brilhozinho nos seus olhos ao ouvir a palavra “incinerar” mostrou que ainda havia algo de nazi naquele judeu.

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