quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O Negócio

O hino do Benfica em formato poli fónico a ressoar pelas paredes do meu quarto ás 5 da manhã só poderia significar uma de duas coisas: ou havia alguma urgência ou então era a minha tia Etelvina, emigrada há 54 anos na Austrália que se esquecera novamente do fuso horário e pretendia contar-me novas acerca do seu papagaio bilingue, que tanto dizia bom dia em Inglês como good morning em Português.
Após bambolear como gelatina pelo quarto com um olho coberto de ramela e um braço inerte por falta de circulação sanguínea, escutei num misto de surpresa e enfado, Laurindo a sussurrar-me ao ouvido que havia descoberto forma de encher os nossos bolsos com algo mais valioso que cotão e recibos de parquímetro de 20 minutos utilizados para 2 horas de estacionamento, num subterrâneo qualquer que se dignasse a alojar um carro que só a ferrugem exterior impede de ser classificado de clássico.
Na ânsia de regressar para o meu leito de sono onde a minha esposa se havia esquecido de colocar o penso no nariz, ressonando a plenos pulmões qual urso polar a proteger as suas crias do predador, anui a discutir o negócio ao almoço na taberna do costume.
Quando cheguei ao local combinado já Laurindo lá se encontrava, dividindo a sua atenção por uma asa de frango e a decoração interior do seu nariz, introspectando também acerca do significado dos caracteres chineses carimbados na omoplata da empregada tentando desta forma ludibriar o seu total absentismo escolar.
Após eu ser informado que filet mignon não fazia parte do cardápio e ter, em alternativa, pedido um bitoque e um chocolate quente, o meu futuro sócio passou a explicar ao que vinha. Havia descoberto um nicho de negócio inexplorado, onde ele pretendia entrar de pé em riste: as garraiadas. Laurindo propunha-se, recorrendo a subsídios europeus, a levar a festa brava a todas as feiras de velharias deste país, montando a arena entre uma banca de álbuns vinil de Nelson Ned e Susie 4 e um pano no chão que delimita o espaço reservado à colecção de colheres de pedreiro comidas pelo cimento do sr. Zé Joaquim. Segundo o meu ex. futuro sócio, já tinha sido apalavrada com um ganadeiro da Madeira a compra de 4 touros no ocaso da sua vida e 2 bezerros sub nutridos, aguardando só a chegada dos contentores que transportariam os animais juntamente com brinquinhos da Madeira, ao porto mais próximo.
Quando cruzei o umbral da porta em direcção ao granizo que caía desenfreadamente na calçada ainda Laurindo gritava, com um peito de frango na mão, que sempre podíamos aproveitar os instrumentos típicos da Ilha para formar uma banda de rock industrial, mas nesta altura a minha mente já só pensava no porquê de ter deixado o fato de oleado e as galochas em casa.

Sem comentários: