quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O Julgamento

Ao fim de anos a fio de sofrimento, chegou finalmente o dia do julgamento da minha cunhada Florinda para pôr termo à sua sociedade conjugal com o meu, agora, ex. cunhado Gracindo, encerador de capôts de profissão, que tem para com as mulheres a mesma sensibilidade que 2 quilos de pedra pomes têm para os meus joanetes.
Para comemorar o que parecia consumado foi preparado pela minha esposa um banquete digno de reis, empestando as minhas assoalhadas habitacionais com um cheiro a fritos que só era atenuado pelo também omnipresente cheiro a pêlo de cão molhado, resultante de uma queda acidental do caniche na pia da cozinha, onde jazia a loiça suja de um almoço que havia contemplado feijoada. Acrescente-se este problema de olfacto ao alarido produzido pelas colegas de trabalho da minha cunhada, trabalhadora assalariada da Divisão de Salubridade da Câmara, vulgo varredora de espaços públicos e está identificada a causa da minha pressa em encaminhar todo o mulherio para o tribunal.
À porta do Domus Invstitiae comprei um combi de pipocas com natas e granizado de ameixa para ir degustando durante o espectáculo, que iria ser antecedido pela actuação do Grupo de Cantares ao Desafio da Costa da Caparica. Esteve também à disposição de todos um Workshop de Apanha de Agrião, ministrado por um antigo paparazzi que se viu obrigado a mudar de profissão com o fim da produção de cartuchos para máquinas Polaroid. Para os amantes da arte, o gabinete da porteira do tribunal estava aberto e lá se encontrava patente uma exposição de print screens com os mais diversos erros e bugs comunicados pelo Windows Vista.
Adquirido o bilhete, fiquei sentado na fila H cadeira 7, o que me deixou exactamente atrás de um pilar de estilo românico que destoava por completo no edifício de traça Gótica e que me impedia de confirmar os rumores que circulavam à minha volta, que diziam que a advogada de defesa estava na flor da idade e exibia cabelo escuro e uma mini saia, tornando difícil de explicar o voto de castidade que havia feito aquando da sua entrada para um Convento de Carmelitas ali para a zona de Foz Côa.
O julgamento decorreu de forma dramática com a Florinda a acusar Gracindo de anos a fio de maus-tratos, consumados em longas sessões de cócegas. Causou grande consternação na audiência a sua descrição daquela noite em que, segundo ela, o futuro ex marido chegou tarde a casa tresandando a leite com mel e pão com tulicreme, trazendo escondida atrás das costas uma pena de pombo correio, com a qual lhe fez cócegas nos pés durante 10 minutos, ficando ela com falta de ar devido a um súbito ataque de asma e com os pés em chaga, deixando também queimar um top da Hello Kitty cujo engomamento foi interrompido por Gracindo, ficando a peça de vestuário desgraçadamente esquecida debaixo do ferro ligado.
O resultado do julgamento só o soube horas mais tarde pois fui abruptamente convidado a abandonar a sala de audiências visto o meu ressonar estar a perturbar o normal funcionamento da sessão.

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